Há uma infinidade de formas de se expressar no ambiente social, mas nem sempre essa comunicação acontece de forma pacífica.
Temos visto no noticiário recente uma série de delitos envolvendo pessoas que, por desconhecimento sobre as “regras” de determinado espaço territorial, acabam sendo mortas por apresentarem comportamentos, gestos ou vestimentas que seriam, em determinadas circunstâncias, autorizadoras para a imposição de violência por parte de grupos de violadores na norma que controlam ilegalmente as comunidades. São autores de crimes que se utilizam da comunicação violenta como forma de gestão das precárias e transitórias relações de poder.
A imposição do controle pelo medo existe “desde que o mundo é mundo”, como dizia a minha velha avó. Esse expediente, bem-sucedido que é, se repete nas microrrelações que envolvem a complexa e sutil convivência em espaços esquecidos pelo Estado.
Esse comportamento delituoso também revela um grau de insegurança notável daqueles que manifestam a violência: quanto maior a perversidade na ação, maior é a debilidade social desse indivíduo.
Por outro lado, quanto mais intenso for o comportamento violento da pessoa, maior será o temor infundido no grupo social. Por falta de repertório para a gestão de seus conflitos externos e internos, esse violador decide apostar no que atinge todo e qualquer ser humano: a imposição de sofrimento ao corpo. Consoante o bardo paraibano Zé Ramalho, “nas torturas toda carne se trai”*.
Em ambientes onde são registrados altos índices de crimes, esses violadores podem estar mais propensos a interpretar qualquer comportamento como um risco que deve ser eliminado. Além dessa espécie de neutralização sumária de potenciais “inimigos”, há a imposição do controle territorial, além de um reforço da simbologia do grupo criminoso, também como parte de um ritual de pertencimento. Ademais, é uma potente advertência aos grupos rivais: não tentem tomar nosso lugar, olhem como agimos!
Ao contrário do Processo Penal – que na dúvida absolve o acusado – nesses territórios é exatamente o oposto: ao visualizar alguém fazendo o gesto de “V” com os dedos e, diante da dúvida se a pessoa está comemorando algo ou homenageando algum grupo criminoso rival, elimine-a. Nesses espaços, a presunção é de culpa. Essa perversão comunicacional atinge o seu limite na gestão política do território.
De fato, geralmente esses gestos inocentes são mal compreendidos. Se uma pessoa desconhece o contexto ou significado de um comportamento simbólico, ou a “proibição” de uma cor de determinada roupa, a outra pode interpretar como uma ameaça, especialmente em situações de tensão cotidiana que esses grupos experimentam.
Por fim, é desolador reconhecer que esses episódios são produtos de uma sociedade desigual, deseducada, embrutecida e que normalizou a violência. O prognóstico não é bom: desde a cadeirada no debate eleitoral até a execução de um jovem que usou uma roupa preta em um local no qual não deveria, nos vemos diante da estética da violência em cinquenta tons de miséria social.
Avante! Até a próxima!
* Verso da canção Vila do Sossego, composta pelo cantor e compositor Zé Ramalho em 1978.
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