Atualizado em 22/09/2025 – 13:18
Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no caso do ex-prefeito João Doria vem criando grande inquietação entre gestores públicos de todo o país. Ao julgar o Recurso Especial n. 2.175.480 – SP, a Corte decidiu que a ação de improbidade administrativa contra o ex-prefeito, por suposta autopromoção com a publicidade do programa “Asfalto Novo”, deveria prosseguir para ser investigada. O STJ não o condenou, mas seu recado foi claro: há indícios suficientes de irregularidade para justificar um processo, e isso muda as regras do jogo para a divulgação de obras em redes sociais.
A preocupação se justifica pelos pontos específicos que o STJ considerou como indícios de improbidade. Primeiro, o fato de Doria ter utilizado em suas redes sociais pessoais as mesmas imagens da campanha publicitária que foi paga com dinheiro público. Segundo, a chocante desproporção dos gastos: em determinado mês, o valor investido na propaganda do programa foi superior ao valor gasto na própria execução das obras. Por fim, o contexto eleitoral, já que a intensa campanha ocorreu logo antes de ele renunciar ao cargo para se candidatar ao governo do Estado, o que sugeriu haver motivação política.
A questão central da publicidade institucional é que deve ser obedecido o princípio da impessoalidade, previsto no art. 37, § 1º da Constituição. A regra determina que toda propaganda do governo deve ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, sem nomes, símbolos ou imagens que promovam pessoalmente as autoridades. Para exemplificar, se a prefeitura divulgasse em seus canais um card puramente informativo com o cronograma de vacinação e os locais, infringiria a norma o prefeito que postasse um vídeo com seu rosto em destaque, usando o slogan de sua gestão para anunciar o mesmo serviço.
É claro que os gestores públicos têm o dever de prestar contas e de informar aos cidadãos sobre os atos que praticam. As redes sociais são uma ferramenta essencial para isso. A legalidade da conduta, no entanto, depende da existência de uma fronteira nítida entre as redes sociais pessoais do político e os canais institucionais do órgão que ele dirige. Nos perfis pessoais, há maior liberdade de comunicação, enquanto nos perfis da prefeitura ou do governo a impessoalidade e o foco no serviço público devem ser absolutos.
Para usar as redes sociais privadas com segurança ao divulgar realizações, algumas regras são fundamentais. A publicidade paga com recursos do erário deve ficar restrita aos canais oficiais, focando na obra e no benefício ao público, em que o político aparece de forma secundária. Se o gestor quiser impulsionar um post sobre a obra em seu perfil pessoal, deve usar recursos próprios, nunca dinheiro público. Além disso, a comunicação institucional deve seguir a identidade visual do ente federativo, evitando slogans e cores de campanha. Antes de postar, pergunte-se sempre: o objetivo é informar o cidadão ou fortalecer minha imagem para a próxima eleição? A resposta a essa pergunta define o nível do seu risco.
Portanto, não há uma proibição ao uso de realizações públicas nas redes sociais privadas dos políticos. Todavia, o caso Doria (REsp 2.175.480) acende um sinal de alerta amarelo piscante, lembrando aos gestores que a linha entre o dever de informar e a autopromoção é tênue e está sob intenso escrutínio. A chave para evitar problemas legais é compreender que os serviços de comunicação, a criação de imagens e a identidade visual pagos com dinheiro do povo devem ser patrimônio exclusivo da pessoa jurídica de direito público. Já a divulgação em perfis pessoais do agente político, ainda que fale de suas realizações na função pública, deve ser financiada, elaborada e difundida por meios claramente apartados do ente que administra.

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