Atualizado em 30/07/2025 – 08:47
A nova lei promulgada no dia 21 de julho pela Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) dá direito aos pais e responsáveis de decidir sobre a participação de seus filhos em atividades escolares que abordam temas relacionados à discussão de gênero. Para compreender as possíveis consequências da medida, o VIXFeed conversou com Erineusa Silva, coordenadora do Núcleo Interinstitucional de Pesquisa em Gênero e Sexualidades da Ufes (Nupeges). Para ela, “impedir que a escola fale sobre gênero também é doutrinar”.
A Lei Nº 12.479, de autoria do deputado Alcântara Filho (Republicanos) e assinada pelo presidente da Casa, Marcelo Santos (União), determina que a participação de estudantes em atividades pedagógicas que abordem temas como identidade de gênero, orientação sexual, diversidade sexual, igualdade de gênero e assuntos relacionados dependerá de autorização prévia dos pais ou responsáveis.
Para Erineusa Silva, a Lei é inconstitucional pois, ao ser promulgada por deputados estaduais, usurpa a competência da União, que é a responsável por legislar sobre a matéria.
“No entanto, mesmo sabendo disso, uma ala conservadora da sociedade, representada pelos deputados que votaram essa lei, o fazem como forma de fomentar o pânico moral nas escolas e de manipular a opinião pública. Isso, especialmente com relação aos familiares, pois ao distorcer o conceito de igualdade de gênero e transformá-lo em uma suposta ameaça de doutrinação, impede-se de se fazer na escola e de forma qualificada pela ciência. É preciso pensar no impacto negativo dessa lei para o combate à violência de gênero e na proteção de populações vulneráveis. Então digo que impedir que a escola fale sobre gênero também é uma forma de doutrinar, doutrinar para o obscurantismo e para a ignorância.”
Para a pesquisadora, a falta de conhecimento e da distorção de informações por alas conservadoras da sociedade afeta a qualidade da educação, que cria ilusões quanto o assunto é identidade de gênero.
“Dizem que discutir gênero nas escolas é ensinar a criança a ‘virar gay’ como se isso fosse possível. Como não discutir as desigualdades salariais entre mulheres e homens? Como não discutir as origens da opressão que geram tantas violências e feminicídios contra mulheres, em especial mulheres pretas, trans e travestis? Pensar uma sociedade de paz é o papel da escola”, afirmou.
Ainda de acordo com Erineusa, a escola desempenha um papel fundamental na formação crítica de alunos e alunas, além de contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva, e tudo isso pode mudar por causa da Lei.
“Quando educadores estão comprometidos com o desenvolvimento humano em sua integralidade, a educação se torna uma ferramenta essencial para combater a desumanização, a perda de senso crítico e a redução das pessoas a meros objetos. Além da família, que às vezes é o espaço onde a criança vivencia violências – pois cerca de 70% das violências ocorrem no entorno da família -, o ambiente escolar é um dos primeiros espaços sociais onde os indivíduos podem aprender a conviver com a diversidade”, defendeu Erineusa.
Pedidos de suspensão
Logo após a publicação da Lei, três organizações defensoras dos direitos da população LGBTQIAPN+ ingressaram com uma ação no Superior Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da norma. O caso foi distribuído à ministra Cármen Lúcia.
O Partido Socialismo e Liberdade (Psol) também entrou na Justiça para que a Lei seja derrubada. “O projeto cria um ambiente de medo nas escolas e prejudica justamente os conteúdos que promovem o respeito, a igualdade e a cidadania. É uma ameaça à liberdade de ensinar e aprender garantida pela Constituição”, disse a deputada Camila Valadão.
O que diz a Secretaria de Estado de Educação (Sedu)
Em nota a Secretaria de Estado da Educação (Sedu) afirma que, mesmo não tendo concordado com a proposição legislativa, conforme manifestação oficial enviada pela Sedu durante a tramitação do projeto, a pasta reitera seu compromisso institucional com o cumprimento das normas legais vigentes.
A manifestação contrária da Sedu, à época, destacou a importância do respeito às diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e do Currículo do Espírito Santo, que orientam uma formação integral e cidadã, e reforçou a defesa da autonomia pedagógica das escolas e profissionais da educação.

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